Uma brevíssima reflexão de todo um universo:
Enquanto na universidade, eu piscava duas ou três vezes enquanto encarava a pessoa que me perguntava em tom confuso: “Mas o que tem a ver? Moda e Arquitetura?”. Quando optei por seguir com os dois cursos para a minha vida acadêmica, nem imaginava como essa relação pode ser pouco clara para algumas pessoas. Não esperava que a pergunta viria de tantos criativos.
Não os julgo, de fato. Apesar de discursos hiperbólicos, poucos cursos da área criativa permitem uma verdadeira interdisciplinaridade no ensino, e acabamos nos formando em moldes estáticos de verdades únicas sobre nossas áreas especificas. Somos pouco estimulados a ver o todo – e não “além”, porque entender o contexto é o básico que podemos fazer. Daí nasceu a grande obsessão em observar e traduzir como o comportamento humano é constantemente interpretado na estética, seja em nossas roupas – nossa segunda pele identitária – como nas nossas casas, e depois, na cidade.
Entendo a confusão primária: o universo da moda, em primeiras impressões, se configura com uma qualidade de extrema efemeridade, e logo, obsolência. Duas características difíceis de ser impressas na Arquitetura, um pouco mais vista nos interiores, mas ainda assim, evitadas – o universo construído por vezes se orgulha da sua atemporalidade. Mas olhando em um espectro maior, talvez as duas afirmações estejam circunstancialmente equivocadas: existem diversas características da Moda que permeiam décadas, assim como a própria Arquitetura se torna ultrapassada depois de certos períodos. O principal condicionante: o zeitgesit, o espírito do tempo, a ótica pelo qual o mundo as observa.
Pode-se dizer que ambas são reflexos do comportamento humano – seja ele mais duradouro ou mais específico. Assim, é muito interessante observar o comércio se apoiando inconscientemente no modelo: lojas de decoração em parceria com grandes marcas de moda; editoriais de moda em cenários que reforcem o conceito da coleção. Afinal, tanto a moda, como a arquitetura e os interiores, são estruturações não verbais de uma história, uma característica ou identificação que contamos através da estética.
É através de elementos de design que essa leitura fica mais clara: signos estéticos que refletem inconscientemente um adjetivo, um estilo ou um comportamento. Um exemplo básico que pode ser aplicado dos interiores, ao varejo até o vestuário é o elemento de simetria para representar o clássico e tradicional, o maduro e imponente. Já a assimetria e a fluidez podem ser ligados às curvas femininas e joviais, ao natural e leve – todo repertório que adquirimos ao longo de centenas de anos como humanos.
São ligações da neurociência à antropologia, que ajudam a delinear como interpretamos ou não estas imagens e as traduzimos como próprio criadores. Ou seja: entendendo como algo se parece e o que comunica, auxilia também à traduzir nosso próprio sentimento como designer, criador e artista da marca. A importância deste entendimento mora também na construção de estratégias, até mesmo de vendas, como uma forma de conexão com um tipo específico de consumidor, seja no ecommerce, no ambiente físico ou até na campanha.
Esta reflexão entra como um recorte brevíssimo de um mundo de paralelos que rendeu três trabalhos de conclusão de curso, artigos e diversos workshops (só da parte desta que voz fala, uma vez que de bibliografia externa, encontramos outras dezenas de perspectivas). São tantas nuances em um universo rizomático de conexões no design, que literalmente construímos uma plataforma para isso. E assim, pisquei mais três vezes antes de responder à pergunta para meu colega confuso – “afinal, moda e arquitetura tem a ver?” -, respirei fundo e comecei a contar.